Considerações acerca do direito dos servidores públicos ao percebimento de sua remuneração
O Servidor público, e o trabalhador em geral, recebe a sua remuneração/salário como forma de contraprestação ao trabalho realizado. Ressalte-se que a remuneração possui a proteção constitucional, sendo vedada a sua retenção, nos termos do art. 7º, X, além de possuir caráter alimentar e imediato, porquanto serve aos servidores/trabalhadores para fazer frente às suas obrigações, recebendo, do legislador constituinte a especial proteção para tanto.
Contudo, por vezes o direito à percepção à remuneração é vulnerado pela Administração Pública em geral. Recentemente o Distrito Federal anunciou que não poderia pagar parcelas remuneratórias aos seus servidores. Em 14.9.2015, o Tribunal de Contas distrital encaminhou alerta para o Poder Executivo, tendo em vista ter sido ultrapassado o limite prudencial para gastos com pessoal do Distrito Federal, nos termos de Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar Federal nº 101/2000).
Contudo, há que se analisar se tais medidas ingressam ou não no complexo de direitos dos servidores públicos distritais, eis que destinatários de tais medidas. Observe-se que, das medidas anunciadas, tem-se que o 13º salário dos aniversariantes de agosto, a licença-prêmio dos aposentados de 2015 e as horas extras do pessoal da saúde estão atrasados e dificilmente seriam pagos a tempo e modo.
Com efeito, o art. 93 da Lei Complementar nº 840/2011 (Regime Jurídico Único dos Servidores do Distrito Federal) determina que, para os servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo, o 13º é pago no mês do aniversário.
Quanto à licença-prêmio, o art. 142 do mesmo diploma legal estabelece que as licenças-prêmio não gozadas serão convertidas em pecúnia quando o servidor for aposentado. Assim, é nesse momento que o valor se torna devido e deve ser pago em âmbito administrativo.
Por fim, as horas extras decorrem do art. 7º, XVI, da Constituição Federal. E tal direito tem como escopo garantir maior remuneração àqueles que ultrapassam a jornada normal. Ora, o impacto é imediato, dado que o servidor, ao fazer jornada extraordinária, se exime do contato com a família, potencializa problemas de saúde, dentre outros aspectos, justamente para cobrir a necessidade do serviço. E mais, tais horas extras são todas devidas a profissionais de saúde, o que realça a importância de seu pagamento.
Veja-se que tais direitos são garantias ao servidor público, que conta com a sua remuneração e os direitos dela decorrentes de forma imediata, até por seu caráter alimentar. A persistir o não pagamento de tais parcelas, é certo que o servidor pode buscar em juízo os valores que lhe são devidos. Para tanto, basta reunir a documentação específica, atinente às fichas financeiras do período, o reconhecimento administrativo das horas extras e da licença-prêmio, além de documentos pessoais para a instrução da ação.
Em arremate, conforme a própria proteção constitucional, é possível que o ente administrativo seja condenado a pagar indenização pela retenção indevida de remuneração, porquanto tal ato supera o mero aborrecimento cotidiano, gerando reflexos na administração financeira do servidor público e de seus dependentes e, por consequência, o dever de indenizar por parte da Administração Pública. Nesse sentido, destaque para o precedente a seguir, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro:
AGRAVO INTERNO. NEGATIVA DE SEGUIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO PELO RITO ORDINÁRIO. SERVIDORES PÚBLICOS. ESCALA DE TRABALHO. VINCULAÇÃO AO EDITAL. RETENÇÃO INJUSTIFICADA DE PARCELA DE REMUNERAÇÃO PELO ESTADO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. 1- No caso e sentença julgou parcialmente procedente o pedido, apenas para condenar o réu a pagar metade da remuneração devida aos autores no mês de dezembro de 2006 e a compensar os danos morais, não acolhendo pleito para modificação da escala de trabalho dos mesmos, que deve observar a previsão editalícia do concurso para provimento do respectivo cargo. Sob essa ótica, apenas o Estado do Rio de Janeiro interpôs apelação, insurgindo-se contra a condenação em danos morais. 2- Lesão extrapatrimonial que se conclui inequívoca na hipótese. Retenção indevida de parcela da remuneração dos autores, sem nenhuma justificativa plausível, que supera o mero aborrecimento cotidiano. Verba alimentar cuja retenção, no caso concreto, causou transtornos à gerência financeira dos autores e feriu a dignidade da pessoa humana. Arbitramento conforme os parâmetros adequados. Manutenção do julgado. – DESPROVIMENTO DO RECURSO.
(TJ-RJ – APL: 00861174520078190001 RJ 0086117-45.2007.8.19.0001, Relator: DES. CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 05/03/2013, NONA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 15/08/2013 10:01)
Sendo assim, caso o servidor sinta-se prejudicado, é possível buscar em juízo a indenização atinente à retenção indevida da remuneração.