Os trabalhadores metalúrgicos e o Programa de Proteção Respiratória
José, 38 anos, rebarbador na indústria metalúrgica há 7 anos, referiu cansaço, dispneia, tosse seca, sudorese noturna. Há alguns meses vem perdendo peso, por volta de 8 quilos. Internado com insuficiência respiratória.
No dia da alta, o médico explica o diagnóstico de silicose, diz que tem uma mancha no pulmão: a poeira se instalou ali e empedrou. Não tem cura, precisa parar de trabalhar com o pó de sílica e tomar remédios para os sintomas. Indiferente, o Doutor acrescenta “pode matar José, tem que se cuidar”.
José na porta do hospital ainda confuso. Está doente, precisa trabalhar e não pode, mas a família depende dele, e acabaram de ter mais um bebê. E agora, José?
O diagnóstico sombrio da doença gerou um turbilhão de sentimentos e pensamentos, a angústia do futuro, o arrependimento do passado, do trabalho dedicado há anos na indústria com um salário tão humilde para agora ainda morrer por causa do trabalho.
José, e agora? Com a chave na mão, quer abrir a porta, mas não sabe como dizer à mulher que está praticamente inválido.
O que resta a José? Arrumar um advogado, enfrentar a previdência, processar a fábrica, cuidar da saúde com o pouco que resta do fundo de garantia. É o que se pode fazer agora, já que o ex-empregador deixou de cumprir com seus deveres de proteção, permitindo o adoecimento precoce e irreversível de José.
Essa estória é fictícia, mas quase idêntica a milhares de outras muito reais, que se repetem ano após ano, em razão da inobservância das regras de proteção ao trabalhador, submetidos ao trabalho em condições de risco à saúde.
Sabe-se que são poucas as empresas que cumprem fielmente suas obrigações legais de higiene e segurança do trabalho. Destas, a maior parte as cumpre unicamente para livrar-se do ônus legal, sem real preocupação com a saúde e segurança dos trabalhadores, atendendo de maneira estritamente formal as obrigações decorrentes da legislação trabalhista, complementadas pelas diretrizes do Ministério do Trabalho e emprego, descuidando do principal objetivo da saúde ocupacional, que é incentivar e manter o mais elevado nível de bem-estar físico, mental e social dos trabalhadores em todas as profissões; prevenir todo o prejuízo causado à saúde destes pelas condições de seu trabalho; protegê-los em seu serviço contra os riscos resultantes da presença de agentes nocivos à sua saúde; colocar e manter o trabalhador em um emprego que convenha às suas aptidões fisiológicas e psicológicas e, em resumo, adaptar o trabalho ao homem e cada homem ao seu trabalho.
É recorrente a constatação de que as empresas que operam com riscos respiratórios não cumprem integralmente o rol de procedimentos de proteção e prevenção de doenças, limitando-se, na maior parte das vezes, a entregar equipamentos de proteção respiratória de forma precária, no ímpeto de afastar a cobrança de adicional de insalubridade, multas, ou eximir-se de responsabilidades pelo adoecimento obreiro.
No entanto, são graves as consequências do comportamento patronal desidioso para a saúde do trabalhador. Os riscos respiratórios, como poeiras, fumos, partículas, névoas, vapores, fungos e bactérias, gases nocivos, devem ser encarados com seriedade, uma vez que podem conduzir a uma infinidade de graves doenças, como a silicose, a beriliose, a siderose, a estanhose, pneumoconiose por metais duros ou por poeiras mistas, asbestose, aluminose, câncer de pulmão e estômago, entre tantas outras.
Com o objetivo de reduzir drasticamente as estatísticas de pneumoconioses, o Ministério do Trabalho e Emprego implementou a Instrução Normativa/MTE nº 1/1994, acrescendo às normas regulamentadoras já existentes um conjunto de medidas para aquisição, uso e adequação dos equipamentos de proteção respiratória, incluindo ensaios de vedação, exames médicos, treinamentos continuados, entre outras obrigações complementares ao empregador.
O Programa de Proteção Respiratória instituído por essa Instrução Normativa, busca orientar e exigir a seleção e uso corretos dos equipamentos de proteção, além de obrigar as empresas a estabelecerem medidas de controle eficazes dos ambientes de trabalho.
O atendimento de todas as exigências da norma é extremamente importante e apesar da insistência dos empregadores no sentido de que o Programa trata-se de mera recomendação, a jurisprudência trabalhista, inclusive do TST, tem reiterado sua obrigatoriedade, para efetiva eliminação do agente insalubre, reforçando que sua inobservância acarreta o Direito do trabalhador à percepção do adicional de insalubridade e o reconhecimento da culpa do empregador por doença respiratória acometida ao trabalhador
Portanto, o estrito integral cumprimento das normas de proteção respiratória atende ao interesse de todos, garantindo a proteção de sua vida e saúde; ao empregador, afastando obrigações e culpabilidade; à sociedade, com a redução do custo social decorrente do imenso contingente de trabalhadores doentes, que acarretam alto custo para a saúde pública e seguridade social.